Cães perigosos e potencialmente perigosos

Muito se ouve falar, ultimamente, sobre cães perigosos e raças potencialmente perigosas, mas a verdade é que é ainda muita a ignorância relativamente a este tema.
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Quais os cães perigosos ou potencialmente perigosos?

Porque se tratam de qualificações legais, é importante conhecermos a lei. A este respeito, nos termos do Decreto-Lei n.º 315/2009, de 29 de Outubro, que aprova o regime jurídico da criação, reprodução e detenção de animais perigosos e potencialmente perigosos, enquanto animais de companhia, considera-se cão perigoso aquele que se encontre numa das seguintes condições:

i) Tenha mordido, atacado ou ofendido o corpo ou a saúde de uma pessoa;

ii) Tenha ferido gravemente ou morto um outro animal, excluindo casos ocorridos dentro da propriedade do seu dono;

iii) Tenha sido declarado pelo seu dono, voluntariamente, como tendo um carácter ou comportamento agressivos; ou

iv) Tenha sido considerado pela autoridade competente como um risco para a segurança de pessoas ou animais, devido ao seu comportamento agressivo ou especificidade fisiológica.

Já os cães potencialmente perigosos são definidos como qualquer cão que, devido às características da espécie, ao comportamento agressivo, ao tamanho ou à potência da mandíbula, possa causar lesão ou morte a pessoas ou outros animais, em particular os cães pertencentes às raças previstas na Portaria n.º 422/2004, de 24 de Abril e cruzamentos destas entre si ou com outras raças:

  1. Fila Brasileiro;
  2. Dogue Argentino;
  3. Pit Bull Terrier;
  4. Rottweiller;
  5. Staffordshire Terrier Americano;
  6. Staffordshire Bull Terrier; e
  7. Tosa Inu.

Os cães de raças potencialmente perigosas apenas podem ser comercializados ou cedidos por centros devidamente autorizados pela Direcção-Geral de Alimentação e Veterinária e devem ser sempre entregues com o microchip, o comprovativo de registo prévio em livro de origens e a apresentação da licença específica para os detentores de animais deste tipo, de que falaremos já de seguida.

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O que implica ter um cão perigoso ou potencialmente perigoso?

Licença

Em primeiro lugar, caso pretenda ter um destes cães, deverá solicitar à sua junta de freguesia uma licença específica para a detenção de cães perigosos ou potencialmente perigosos.

Para solicitar esta licença, deverá apresentar os seguintes documentos:

i) Termo de responsabilidade, conforme o modelo previsto no Decreto-Lei n.º 315/2009, de 29 de Outubro – trata-se de uma declaração muito simples onde refere não ter sido privado do direito de deter este tipo de cães e declara assumir a responsabilidade pela detenção de um destes cães;

ii) Certificado do registo criminal – caso tenha sido condenado pelo crime de promoção de lutas entre animais, ofensas à integridade física ou circulação em locais públicos ou partes comuns de prédios com um cão perigoso ou potencialmente perigoso sob o efeito de álcool ou drogas, homicídio, tráfico, entre outros previstos no referido Decreto-Lei, esta licença ser-lhe-á negada;

iii) Prova de que celebrou um seguro de responsabilidade civil, com o capital mínimo de € 50.000,00 – se quiser saber mais sobre este ou outros seguros para cães, poderá ler este nosso artigo;

iv) Comprovativo de esterilização, quando obrigatória – a esterilização é obrigatória para os cães perigosos ou que demonstrem um comportamento agressivo, bem como os cães de raças potencialmente perigosas que não estejam inscritos em livro de origens oficialmente reconhecido, bem como os resultantes dos cruzamentos entre estas raças entre si ou com outras;

v) Boletim sanitário actualizado que comprove, em especial, a vacinação anti-rábica; e

vi) Comprovativo de aprovação em formação para a detenção de cães perigosos ou potencialmente perigosos – esta formação apenas pode ser ministrada pelas entidades devidamente certificadas pela Direcção-Geral de Alimentação e Veterinária.

Esta licença pode ser solicitada pelas autoridades a qualquer momento, pelo que, sempre que estiver com o seu cão, deverá fazer-se acompanhar da mesma.

Dever especial de vigilância

Os detentores de cães perigosos ou potencialmente perigosos ficam obrigados a um dever especial de os vigiar, de forma a evitar que estes coloquem em causa a vida ou a integridade física de outras pessoas e animais.

Medidas de segurança reforçadas em casa

As residências de quem detenha um cão perigoso ou potencialmente perigoso devem apresentar medidas de segurança reforçadas, por forma a evitar a fuga dos mesmos, e devem acautelar de forma eficaz a segurança de pessoas, outros animais e bens. A lei prevê, em específico, o seguinte:

i) Devem existir vedações com, pelo menos, 2 m de altura em material resistente, que separem o alojamento destes animais da via ou espaços públicos, bem como de habitações vizinhas;

ii) O espaçamento entre o gradeamento ou entre este e os portões ou muros não pode ser superior a 5 cm;

iii) No exterior do local de alojamento do cão e da residência devem ser afixadas, de modo visível e legível, placas de aviso da presença e perigosidade do animal.

Medidas de segurança reforçadas na circulação

No que respeita à circulação na via pública, em locais públicos ou em partes comuns de prédios, aplicam-se as seguintes medidas de segurança reforçadas:

i) Condução por uma pessoa maior de 16 anos que se faça acompanhar da licença específica para a detenção deste tipo de cães;

ii) Utilização de açaimo funcional que não permita comer nem morder;

iii) Utilização de trela curta, até 1 m de comprimento, que deve estar fixa a uma coleira ou a um peitoral.

Treino

Quem tenha um cão perigoso ou potencialmente perigoso fica obrigado a promover o treino do mesmo, com vista à sua socialização e obediência, que se deve iniciar entre os 6 e os 12 meses de idade do cão.

Este treino só pode ser realizado em escolas de treino ou terrenos privados próprios para o efeito e apenas pode ser ministrado por treinadores devidamente autorizados pela Direcção-Geral de Alimentação e Veterinária – poderá encontrar a lista destes treinadores no site desta entidade.

Sanções

As coimas previstas para o incumprimento das obrigações aqui referidas vão desde os € 750 até aos € 5.000, para pessoas singulares, sendo os valores bastante mais altos quando se tratam de empresas.

A estas coimas podem ainda juntar-se outras medidas, tais como a apreensão provisória dos cães, e a aplicação de outras sanções acessórias, como, por exemplo, a perda do cão e a privação do direito de deter outros cães perigosos ou potencialmente perigosos por um período máximo de 10 anos.

O porquê desta legislação

Muitas são as críticas que se ouvem a esta legislação. Sendo certo que muitas das suas soluções poderiam ser melhoradas, é importante, no entanto, estarmos conscientes das razões que levaram à sua aprovação.

Esta legislação surgiu na sequência da divulgação, pela comunicação social, de muitas notícias sobre ataques a cães e pessoas, causando graves danos ou até mesmo a morte das vítimas. O mediatismo que se gerou à volta destes casos veio dar o alerta para a necessidade urgente de regulamentar a detenção e criação deste tipo de animais.

De facto, esta legislação assenta na convicção – da qual partilhamos – de que a perigosidade canina, mais do que aquela que seja eventualmente inerente à raça ou cruzamento de raças, prende-se com factores relacionados com o tipo de treino que é ministrado ao cão – muitas vezes dirigido para a violência – e com a ausência de socialização a que os cães são sujeitos, absolutamente essencial para o seu equilíbrio e bem-estar.

A verdade, contudo, é que a ignorância e a irreflexão com que muitos encaram, ainda, a detenção de um animal não se soluciona com a mera aprovação de legislação. Para isso, é essencial que se proceda a um grande esforço de sensibilização das pessoas para as consequências e responsabilidades de ter um cão e, muito especialmente, um cão com estas características.